quarta-feira, 13 de abril de 2011

terça-feira, 12 de abril de 2011

A inadiável decisão

Em 1757 Jean-Jacques Rousseau escreveu Emílio, um romance que marcará profundamente o pensamento pedagógico moderno; nessa obra ele propõe princípios e métodos educacionais que impeçam que uma criança (sempre boa por natureza, tal como, acredita ele, assim nasce qualquer mulher e homem) torne-se má ao ficar adulto. Rousseau proclama a “bondade natural” das pessoas, mas teme sempre que a vida social apodreça essa condição inicial; desse modo é preciso uma educação com métodos ativos com respeito á personalidade infantil, e que impeça a concorrência de descaminhos maléficos.

Na mesma Europa do Filósofo Rousseau, mas já no século XX uma menina alemã de ascendência judaica teve de interromper um “diário” em que escrevia como vivia escondida durante dois anos em um forro de uma casa em Amsterdã. Anne Frank foi aprisionada na Holanda pelos nazistas que, caçavam sem piedade aos que tivessem qualquer vínculo semita. Entre 1942 e 1944 ela houvera anotado (como em um blog) tudo o que sentia, vivia e doía no esconderijo; mas também indicava as alegrias e esperanças que despontavam em meio ao pânico habitual, daqueles que, a qualquer instante, podem ser vitimados pelo hediondo.

Essa adolescente aos 15 anos de idade, foi levada para a Alemanha, ao campo de concentração; em Abril de 1945 as forças aliadas representadas pelos ingleses, conseguiram tomar esse campo e se depararam com a mais real constatação do horror: milhares de cadáveres e o registro sistemático do assassinato de quase 40.000 pessoas, entre elas, Anne, executada um mês antes da tomada.

Em 1947 as anotações da menina sobreviveram e foram publicadas como “O diário de Anne Frank”. O mais incrível, porém, é encontrar nesse diário uma frase de surpreendente de Anne: “Apesar de tudo, eu ainda creio na bondade humana”. Como é possível? Depois de tudo? Tanto padecimento, tanto martírio, tanta tortura, tanta atrocidade! E, de novo, tanta confiança e alento.

A maldade não é humana? Chama-se de brutalidade, bestialidade ou animalidade ao ato praticado por um homem ou uma mulher que pareçam ter perdido o juízo ou feito algo que se entende como desumano. Desumano? Ora, somos capazes disso! Nossa liberdade nos permite e nos incrimina, nosso arbítrio nos autoriza e nos inculpa; diferentemente de outros seres, temos maior condição de autonomamente decidir e desobedecer.

Crédulo Rousseau, inocente Anne. Ou, é melhor sermos funestamente realistas? Ainda há tempo; qual a nossa escolha?

Autor: Mario Sergio Cortella
in Não espere pelo Epitáfio